Brasileiros que cantavam em inglês
Viaje pelas entrelinhas do texto enquanto ouve as músicas do Vinil da Semana, clicando aqui. Boa leitura e bom som.
O mercado brasileiro sempre foi um terreno fértil para a música produzida lá fora, apesar da indiscutível qualidade da nossa. Nos anos 1970, houve uma verdadeira enxurrada dessas músicas na programação das rádios; e a saída para muitos artistas foi se americanizar, começando pelo nome.
Com pouco domínio da língua inglesa, havia muita improvisação, com “ajuntamento” de frases que tivessem certo sentido. Em outros casos, os artistas escreviam primeiro em português e depois faziam a tradução. O importante era que o ritmo embalasse os corações apaixonados, que também não tinham muita noção do que estavam ouvindo, pois acreditavam que aquelas canções eram realmente de estrangeiros.
As gravadoras, para manter os lucros em alta, embarcaram nessa onda, pois pagar direitos autorais aos estrangeiros era muito dispendioso. A grande maioria desses artistas era composta de músicos experimentados – muitos deles da extinta Jovem Guarda, que se viram numa espécie de “limbo” após o declínio do gênero –, mas, praticamente todos se tratavam de profissionais anônimos.
O sucesso das primeiras trilhas internacionais das novelas certamente contribuiu para difundir esse fenômeno. O cantor Fábio Jr. foi um dos que usou pseudônimo – no caso dele, dois, a propósito: Mark Davis, com o qual emplacou o sucesso Don´t Let Me Cry, e Uncle Jack, utilizado para gravar My Baby. Já usando seu nome verdadeiro, apresentou, ao lado do cantor Sílvio Brito, o programa pop Halleluyah!, na extinta TV Tupi – acredite, o tema de abertura era uma música do Black Sabbath!
Um dos que mais sucesso fez – e que muitos sabiam ser brasileiro – foi Chrystian (da futura dupla sertaneja Chrystian e Ralf), cujo nome verdadeiro é José Pereira da Silva. Entre seus vários hits estava a balada Don´t Say Goodbye, que estourou nas rádios no ano de 1974. Seu irmão Ralf não demoraria a imitá-lo e, com o pseudônimo Don Elliot, emplacou sucessos como One Day In Your Life – originalmente de Michael Jackson.
Terry Winter era o pseudônimo de Thomas William Standen, que começou a cantar ainda nos anos 1960, em português. Neto de ingleses que vieram para o Brasil, fez sucesso interpretando composições próprias como Our Love Dream e Summer Holiday, que tocou muito na primeira metade dos anos 1970 em vários continentes.
Dave MacLean emplacou hits como Me and You e We Said Goodbye – esta recebeu disco de ouro no Brasil e no México. O cantor obteve reconhecimento em vários países, como Portugal, Espanha, França, Inglaterra e Estados Unidos, além de toda a América Latina.
Patrick Dimon – nome artístico de Konstantynos Kazakos – nasceu na ilha de Samos, na Grécia, e é conterrâneo do filósofo e matemático Pitágoras (nascido cerca de 2.600 anos antes). Começou a cantar no Brasil em 1969 e fez sucesso com a música Pigeon Without a Dove, adaptação de uma ária do clássico O Guarani, de Antônio Carlos Gomes. Ganhou discos de ouro, platina e diamante e não raro era confundido com outro grego: Demis Roussos.
Light Reflections, por sua vez, foi uma banda que lançou, em 1972, Tell Me Once Again, que em menos de um mês já estava entre as 10 primeiras em todas as paradas do Brasil. A música estourou dentro e fora do país, e a banda gravou oito compactos e dois LPs em apenas cinco meses.
A banda Lee Jackson teve um grande hit nas paradas, Hey Girl, gravada em 1973, e a honra de acompanhar o roqueiro Bill Haley quando este veio ao Brasil, em 1975.
O cantor Jessé, antes de embarcar em Porto Solidão, também fez sua parte cantando sucessos como If You Could Remember, usando o nome de Tony Stevens.
Com uma longa carreira de sucessos, Michael Sullivan (Ivanilton) começou fazendo parte das bandas Renato e Seus Blue Caps e The Fevers. Estourou em carreira solo gravando My Life, depois ganhou muito dinheiro em parceria com Paulo Massadas compondo para a apresentadora Xuxa e o conjunto mirim Trem da Alegria. Vale registrar que a dupla fez Me Dê Motivo, para o astro Tim Maia.
Pholhas foi uma banda criada em 1969, que não escondia sua origem – ver pelo nome –, mas podia muito bem ser confundida com um grupo composto por gringos, pois tinha um som muito apurado e vocal estiloso. Seu primeiro LP, Dead Faces, lançado em 1972, veio recheado de sucessos, como She Made Me Cry, I Never Did Before e My Mistake, sem contar Forever, que saiu em compacto. Com vários discos gravados, ainda faz sucesso em bailes e shows Brasil afora e também no exterior.
Todos esses artistas emplacaram fora do Brasil, pelo menos em alguns continentes. Mas quem ficou famoso mesmo foi Morris Albert (Maurício Alberto Kaiserman), que colocou Feelings no mais alto panteão. Em 1975, a canção chegou aos Estados Unidos, ficando 32 semanas na parada da Bilboard, além de ser indicada para quatro categorias do Grammy. Se não bastasse, foi gravada por artistas como Frank Sinatra, Johnny Mathis, Sarah Vaughan, Ella Fitzgerald, Nina Simone e inúmeras bandas e orquestras. Os roqueiros do Offspring também fizeram sua versão nos anos 1980, só que trocando a palavra “amor” por “ódio”.
Naquela mesma década, o compositor francês Loulou Gäste ganhou um processo contra Morris Albert, alegando que Feelings plagiava a melodia de sua canção Pour Toi, de 1957. O detalhe é que o sr. Gäste também havia surrupiado algumas notas da música Artistry in Rhythm, de Stan Kenton, que, por sua vez, se parece muito com um trecho de Daphnis et Chloe, de Ravel – no frigir dos ovos, portanto, não se sabe se a música é de Maurício Alberto ou Maurice Ravel. Outro grande sucesso do brasileiro foi She’s My Girl.
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