Carmen Miranda

Viaje pelas entrelinhas do texto enquanto ouve as músicas do Vinil da Semana, clicando aqui. Boa leitura e bom som.

Maria do Carmo Miranda da Cunha nasceu em 9 de fevereiro de 1909, em Marco de Canaveses, na província do Porto (Portugal). Veio para o Brasil com apenas 10 meses de idade.

Carmen foi criada na Lapa carioca, que nas décadas de 1910 e 1920 era um caldeirão cultural de artistas, malandros e gente de todo tipo. Assimilando a estética, a linguagem e as sonoridades do lugar, aprendeu as gírias e expressões das rodas boêmias e criou uma personagem que marcaria como poucos o século 20.

Talentosa, não só cantava, dançava e atuava, mas transitava com rara desenvoltura pelo que viria a se tornar a indústria cultural. Ela eternizou os mais importantes compositores de seu tempo, de Lamartine Babo a Ary Barroso, de Dorival Caymmi a Pixinguinha.

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Carmen teve o seu primeiro emprego aos 14 anos numa loja de gravatas. Em seguida, foi contratada por uma chapelaria, onde desenvolveu seu dom para criação de adereços.

Em 1929, gravou o samba Não Vá Sim’bora e o choro Se o Samba é Moda. O sucesso veio com Ta-hi! (de Joubert de Carvalho), canção com a qual alcançou uma popularidade tão grande que em poucos meses já era a cantora mais famosa do Brasil, tornando-se a primeira artista de rádio a assinar contrato com uma emissora, quando na época todos recebiam somente cachês.

Acompanhada pelo Bando da Lua, começou uma série de turnês pelo Brasil. Sentia-se à vontade com os homens e não se importava em ouvir piadas picantes, inclusive gostava de contar as suas. Em função da pouca estatura, usava saltos enormes – e o radialista César Ladeira a batizou de “A pequena notável”.

Em 1936, estreou o filme Alô, Alô Carnaval, em que ela e sua irmã Aurora Miranda interpretam Cantoras do Rádio, e em Banana da Terra (de 1939) inaugurou o estilo que a consagrou no mundo. Ela interpretou O Que é Que a Baiana Tem? (de Dorival Caymmi) usando as famosas roupas de baiana, turbantes, altíssimas sandálias de plataforma e inúmeros colares e pulseiras.

Quando estava em temporada no Cassino da Urca, chamou a atenção do magnata americano do show business Lee Shubert. Era a época da política da boa vizinhança – iniciativa do governo norte-americano que buscava aproximar o país da América Latina, nos anos 1930 – e isso contribuiu para que o empresário a convidasse a ir para os Estados Unidos. Carmen, por sua vez, só assinou o contrato com a condição de levar seu grupo, o Bando da Lua.

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Estreou em solo norte-americano em 1939, já causando estardalhaço no espetáculo The Streets of Paris – peça da Broadway estrelada pelos comediantes Abbott e Costello. Este show transformou sua vida e a fez ficar conhecida como The Brazilian Bombshell.

Quase que instantaneamente, em 1940, fez sua estreia no cinema americano no filme Serenata Tropical, ao lado de Don Ameche e Betty Grable. Suas roupas exóticas e o sotaque latino tornaram-se marca registrada. Nessa época, foi eleita a terceira personalidade mais popular nos Estados Unidos, sendo convidada para se apresentar para o presidente Franklin Roosevelt, na Casa Branca.

Cantava em português – também em inglês – para um público que não entendia uma palavra da nossa língua, embora muitos tenham aprendido o refrão de Mamãe Eu Quero (música composta por Jararaca, da dupla caipira Jararaca e Ratinho). Por dois anos consecutivos, Carmen foi a artista que mais faturou nos Estados Unidos.

Quando voltou ao Brasil, recebeu fortes críticas por parte de jornalistas e intelectuais, que afirmaram que ela estava “americanizada”. De outro lado, foi criticada pelos sambas que cantava – de origem “negróide” –, que não representavam a música brasileira, já que tínhamos compositores clássicos como Antônio Carlos Gomes. No entanto, o povo a adorava, e o maestro Heitor Villa-Lobos declarou que o Brasil tinha uma dívida grande com ela, pela divulgação que fez da nossa cultura em todo o mundo.

Em 20 anos de carreira, Carmen deixou sua voz registrada em 279 gravações no Brasil e estrelou cinco filmes nacionais. Nos EUA foram 34 discos e 14 filmes. Em 1941, ela gravou as mãos e plataformas no cimento da Calçada da Fama, em Los Angeles e, em 1998, o cruzamento da Hollywood Boulevard e Orange Drive foi oficialmente nomeado Carmen Miranda Square.

Carmen contracenou com os principais artistas da época, como Betty Grable, Elizabeth Taylor, Groucho Marx e Cesar Romero (que nos anos 1960 interpretou o Coringa do seriado Batman). Apareceu em desenhos animados de Tom & Jerry, Popeye e Looney Tunes. Foi imitada e caricaturada por Rita Hayworth, Lucille Ball, Bob Hope, Jerry Lewis, Mickey Rooney e Dean Martin. Ela era ressentida com os estúdios, pois nunca lhe permitiram interpretar outra personagem; como seu estereótipo era muito popular, acabou virando refém de si mesma. No entanto, ela fazia suas cobranças: “Vão ter que me pagar melhor, senão retiro o meu sotaque!”.

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O figurino inspirado nas roupas das tradicionais baianas ganhou o apelido de “Miranda Look” e foram copiados por outras artistas e expostos nas vitrines. Influenciou chapeleiros e desbancou criações de Dior e Chanel, e ainda hoje a moda se inspira em seus temas nos lançamentos de Prada, Versace e Dolce Gabbana, sem contar as grifes brasileiras.

No fim dos anos 1940, Carmen excursionou por toda a Europa e sua temporada em Londres bateu recordes de público – sua fama fez com que muitas meninas inglesas fossem batizadas como Carmen.

Em 1947, casou-se com o norte-americano David Sebastian, que se mostrou um avarento empresário, fazendo-a cumprir jornadas extenuantes. O casamento entrou em crise por conta de traições e brigas violentas que a levaram à depressão. O aborto sofrido na mesma época, além do abuso de bebidas e sedativos, só agravaram suas crises.

Em 1954, Carmen veio ao Brasil para tratamento, mas teve que retornar breve aos Estados Unidos. Durante uma apresentação na TV, sentiu um mal-estar e, na manhã seguinte, foi encontrada morta em sua casa, em Beverly Hills, vítima de um enfarto, em 5 de agosto de 1955 (aos 46 anos).

Em 1995, ela foi tema do excelente documentário Carmen Miranda: Bananas is My Business, dirigido por Helena Solberg. Também teve sua história narrada por Ruy Castro, um dos principais biógrafos brasileiros da atualidade.



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