BELCHIOR

Antônio Carlos Belchior nasceu em Sobral (Ceará), em 26 de outubro de 1946. Além de cantor, compositor e pintor, ele foi um dos grandes poetas da música brasileira. Começou a carreira no grupo Pessoal do Ceará, um movimento cultural composto por profissionais de diversas áreas; e dele faziam parte Fagner, Ednardo, Rodger Rogério, Fausto Nilo, Téti e Amelinha, entre outros.

As letras de suas canções (muitas delas censuradas pelo governo militar) trazem fragmentos de poetas e romancistas tanto brasileiros como estrangeiros, e o apreço pela poesia se manifestava também nos encartes dos discos, que se assemelham muitas vezes à poesia concreta.

Belchior estabeleceu um diálogo entre a música tradicional nordestina, a MPB, o rock e o folk, trazendo para suas composições a tensão entre o espaço urbano e o sertão, que tem a ver com sua própria trajetória. Foi uma época de redescobrimento da música do Nordeste, que acabou influenciando compositores de outras partes do país. Paralelamente havia o pessoal de Pernambuco, principalmente nas figuras de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Quinteto Violado e Banda de Pau e Corda; e um pouco mais tarde Elba e Zé Ramalho, saídos da Paraíba. Em Minas Gerais, o Vale do Jequitinhonha foi o grande fervedouro.

Durante a infância, Belchior estudou canto gregoriano e piano, seu avô tocava flauta e saxofone e sua mãe cantava no coral da igreja. Foi programador de rádio em Sobral e, em 1962, mudou-se para Fortaleza, onde estudou Filosofia e Ciências Humanas, começou Medicina, mas abandonou o curso para dedicar-se à carreira artística.

De 1965 a 1970 apresentou-se em festivais de música no Nordeste. Em 1971, quando se mudou para o Rio de Janeiro, venceu o IV Festival Universitário da MPB, com a canção Na Hora do Almoço, interpretada pelos amigos Jorge Telles e Jorge Nery. Em São Paulo, para onde se mudou, compôs para filmes de curta metragem, trabalhando às vezes com o grupo do Ceará.

Com seu primeiro LP (de 1974, pela Philips), suas músicas ganharam visibilidade e foram gravadas por outros intérpretes. A consagração veio com a balada Apenas um Rapaz Latino-Americano, além de A Palo Seco, Como Nossos Pais e Velha Roupa Colorida, do álbum Alucinação – considerado por vários críticos como um dos mais revolucionários da MPB. As duas últimas músicas citadas estão no disco Falso Brilhante, de Elis Regina.

Contratado pela gravadora Warner, em 1977, ele fez Coração Selvagem, do qual se destacam Pequeno Mapa do Tempo, Paralelas (sucesso com Vanusa) e Galos, Noites e Quintais, lançada por Jair Rodrigues. Em seguida saiu Todos os Sentidos, com destaque para Divina Comédia Humana, Brincando com a Vida e Na Hora do Almoço. O LP Era uma Vez um Homem e Seu Tempo (1979) trouxe Medo de Avião, Brasileiramente Linda e Comentário a Respeito de John – um ano antes da morte de John Lennon.

No disco Paraíso (1982), Belchior abriu espaço para compositores como Guilherme Arantes e Arnaldo Antunes (antes dos Titãs). Em 1986 ele lançou Um Show – Dez Anos de Sucesso, depois gravou o LP Elogio da Loucura. O álbum Vício Elegante (1996) é composto por regravações de outros artistas, onde interpreta Zé Ramalho, Adriana Calcanhotto, Caetano Veloso, Chico Buarque, Roberto e Erasmo Carlos.

Belchior teve algumas desavenças com Fagner, por ele ter mudado a melodia de Mucuripe, feita em parceria. Separaram-se quando foram para o Rio de Janeiro, e Fagner sempre deixou claro que não havia amizade entre eles, mas cantaram juntos num show do amigo Ednardo (autor de Pavão Mysteriozo).

Apesar de se declarar fã e reconhecer a importância de Caetano Veloso, Belchior lhe fez críticas em Apenas um Rapaz Latino-Americano, onde se refere ao baiano como representante do velho, estabelecido. Caetano considerou que era um diálogo válido, mas não se completava porque o Pessoal do Ceará era, em parte, uma versão do tropicalismo. E que só Belchior tinha autoridade para dizer o que disse, pois sua música propunha uma ruptura, ela veio para anunciar novos ventos de estilo – ainda confessou que a poesia do cearense o emocionara algumas vezes.

Lançado em 2004, As Várias Caras de Drummond é fruto do empenho do músico em criar melodias para nada menos do que 31 poemas de Carlos Drummond de Andrade, e veio acompanhado de 31 gravuras do poeta mineiro feitas pelo próprio Belchior.

Em 2005, ele deixou sua esposa e abandonou carreira e bens pessoais, enfrentou processos judiciais e teve suas contas bancárias bloqueadas. Com a nova esposa, a produtora cultural Edna Assunção (que impedia que o cantor saísse em público), ele perambulou por pelo menos dez cidades do Rio Grande do Sul. Sem residência fixa, sem dinheiro no banco e sem parentes importantes – conforme a letra de sua música – o cantor era recebido em casas de amigos e fãs.

Em 2009, a Rede Globo resolveu partir em seu encalço e o encontrou no Uruguai, e uma repórter do programa Fantástico praticamente arrombou a porta para que ele concedesse uma entrevista. O cantor, tranquilo, revelou que não havia desaparecido e estava preparando, além de um disco de canções inéditas, o lançamento de sua obra também em espanhol.

Mas seus projetos findaram em 30 de abril de 2017, quando sofreu um aneurisma da aorta e morreu na cidade de Santa Cruz do Sul/RS. Quatro meses depois, chegou às livrarias Belchior – Apenas um Rapaz Latino-Americano, a biografia assinada pelo jornalista e crítico musical Jotabê Medeiros. A rapidez do lançamento se deu porque o livro já estava em fase final de produção, mas teve que sofrer algumas mudanças.

Belchior foi homenageado, em fevereiro de 2016 – um ano antes de sua morte –, por um bloco carnavalesco de Belo Horizonte, o Volta, Belchior, com todos os foliões usando um bigode a la Zapata e cantando suas músicas em ritmo de carnaval.

De tantos versos que deixou, vale lembrar alguns de Alucinação: “Eu não estou interessado / Em nenhuma teoria / Nem nessas coisas do Oriente / Romances astrais / A minha alucinação / É suportar o dia-a-dia / E meu delírio / É a experiência / Com coisas reais // Me interessa mais / Amar e mudar as coisas”.

Agora é só curtir a playlist especial que criamos no Spotify, clicando aqui.



  • Agência
  • Alucinação
  • Belchior
  • comunicação
  • MPB
  • música
  • música brasileira
  • Música nacional
  • vinil
  • vinil da semana


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *