Punk Brasil
Enquanto lê o post abaixo, curta algumas músicas da banda Cólera clicando aqui.
O cenário musical brasileiro até o princípio dos anos 1980 não era muito favorável ao rock, tudo era voltado à MPB. Mesmo com nomes de peso como Rita Lee e Raul Seixas, o rock ainda era muito marginalizado e sem projeção na mídia.
O ano de 1982 foi o estopim das mudanças, quando as gravadoras resolveram contratar algumas bandas que já eram conhecidas no underground (e divulgadas pela rádio Fluminense). Daí surgiram os grupos que ocuparam o espaço com novas propostas, influenciados principalmente pela new wave, criando um cenário para o nascimento do “Rock Brasil.” Só que a new wave foi uma versão adocicada e bem vestida do punk.
A banda Restos de Nada nasceu inspirada em grupos radicais dos EUA e Inglaterra como o MC5, The Stooges e Sex Pistols. Em 1978 ela foi se definindo pelo formato punk, enquanto surgiam outros grupos que foram adaptando o estilo à realidade local.
O primeiro álbum do punk brasileiro foi o Grito Suburbano, compilação com Inocentes, Olho Seco e Cólera, em 1982. Foi gravado em um dia, em meio ao atrito entre os técnicos do estúdio que tentavam eliminar a distorção e a insistência dos meninos de que aquilo fazia parte do som.
O grosso do movimento foi em São Paulo, devido às características de metrópole carregada de filhos de proletários desempregados e sem perspectativas, e que não encontravam na música brasileira algo que refletisse sua realidade.
As bandas em geral não eram unidas e volta e meia aconteciam confrontos entre as turmas de diferentes regiões de São Paulo, e a polícia se satisfazia nas escaramuças de final de baile. Os grupos não tinham nenhum direcionamento, o que havia em comum era a vontade de derrubar as instituições para construir algo novo.
As indumentárias eram improvisadas e simples, refletindo o que acontecia lá fora – roupas rasgadas, cabelos espetados, botas militares e alfinetes (antes da moda piercing), mas acrescentavam elementos próprios, como o uso de correntes por alguns.
Foi realizado em 1982 o concerto O Começo do Fim do Mundo, que ficou como o marco inicial do punk brasileiro, com 20 bandas da cidade de São Paulo e do ABC paulista. Era uma proposta para aparar as arestas, já que viviam realidades diferentes e sempre havia uma conflito quando se encontravam. O evento foi divulgado na mídia de todo o mundo como o maior encontro punk do planeta, foi gravado em tape e se transformou em um LP com os principais grupos.
Em 1983 saiu a coletânea SUB, pelo selo do vocalista e guitarrista do Cólera, Redson – que convidou os grupos Ratos de Porão, Psykóze e Fogo Cruzado.
Além das bandas acima, ainda havia os Condutores de Cadáveres, M19, Lixomania, Excomungados, Mercenárias e Garotos Podres entre tantas. Do Rio de Janeiro saíram: Coquetel Molotov, Eutanásia e Descarga Suburbana. Algumas delas ficaram conhecidas lá fora, por serem incluídas em diversas coletâneas punk, além de fazerem excursões pela Europa tocando em squats (imóveis abandonados, geralmente ocupados por sem-tetos).
Belo Horizonte também tem uma cena punk e a banda mais famosa é o Atack Epiléptico – com mais de 30 anos de estrada. Nos anos 1980 existiu o grupo Sexo Explícito (que tinha como guitarrista o John do Pato Fu), não era punk de fato, mas carregava em seu trabalho a ideologia.
Bandas de outras cidades resolveram ir para São Paulo, onde a cena estava mais consolidada. Foi o caso dos baianos do Camisa de Vênus, dos gaúchos Replicantes, e a turma de Brasília: Detrito Federal, Plebe Rude, Capital Inicial e Legião Urbana (os dois últimos são um desdobramento do precursor Aborto Elétrico).
O movimento chamou a atenção da mídia, e a rede Globo procurou alguns líderes de São Paulo para fazer uma reportagem. Foram à Galeria do Rock, pagaram cerveja, e os meninos abriram o verbo. Qual não foi a surpresa quando viram a matéria no Fantástico retratando o movimento não como um fenômeno social e cultural, mas como um caso de polícia, devido ao grau de violência daqueles indivíduos desocupados. Na segunda-feira muita gente perdeu o emprego, chegava no trabalho e se deparava com os colegas de olhos esbugalhados: “Mas você é aquilo que eu vi na televisão ontem? Pode passar no departamento pessoal e acertar suas contas.”
Na segunda metade dos anos 1980, houve uma simbiose entre algumas bandas punk/hardcore com o pessoal do trash metal. Ratos de Porão chegou a gravar na Cogumelo (em BH) e costumava andar com o Sepultura, fato raro, pois metal e punk são como água e vinho.
Em 1988, alguns punks uniram-se oficialmente com grupos anarquistas, criando assim os Anarcopunks. Em geral, o movimento defende valores como o anti-machismo, anti-homofobia, anti-fascismo, liberdade individual, meio ambiente etc. As brigas entre punks e skinheads (e neo-nazistas) ainda existem.
A partir dos anos 1990 o punk rock voltou com tudo no Brasil, muito graças à divulgação pela internet (substituindo os antigos fanzines xerocados) e pelo interesse de algumas gravadoras. Começaria então a era do hardcore melódico, com nomes como Dead Fish, Dread Full, Pinheads, Primal Therapy, Garage Fuzz entre tantas outras.
Um grupo considerado precursor no Brasil foi o Joelho de Porco, uma mistura de punk com humor – além de músicos, era composto por atores, fotógrafos e publicitários! Começaram em 1972, com um compacto produzido pelo Mutante Arnaldo Baptista.
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